Rádio Extraclassse Kolping

sábado, 21 de abril de 2012

Como estudar: ensine seu cérebro a se concentrar

Por Mundo Vestibular
Deixar o celular longe, reunir o material de estudo de forma organizada, desligar a TV, sair da Internet, deixar água e algum lanche por perto, ficar sozinho e seguir um bom planejamento ajudam a melhorar o rendimento quando você precisa estudar, mas... cadê a concentração?

Se mesmo com toda a preparação do mundo seus pensamentos continuam bem longe da matéria que você precisa estudar e está difícil focar no mesmo texto ou exercício, dê uma olhada nestas três técnicas. Você pode usá-las separadamente, ou fazer um combinado para ajudar seu cérebro a se concentrar. Sim, é possível treinar o cérebro para focar numa única tarefa por mais tempo, do mesmo jeito que se pode treinar o corpo para fazer musculação, aprender capoeira, dançar ou correr uma maratona. 

Técnica do Intervalo

Se está difícil de se concentrar, forçar a barra para passar horas e horas diante dos livros não ajuda em nada. Se a ideia é começar a treinar seu cérebro para tirar o melhor proveito das suas horas de estudo, vale começar aos poucos.
A Técnica Pomodoro, inventada em 1980 por Francesco Cirillo, é um método de gerenciamento do tempo. A ideia é simples: usar um timer para marcar pequenos períodos de produtividade. Você pode usar um daqueles timers de cozinha, qualquer relógio ou mesmo o seu celular. O método recomenda 25 minutos de concentração, mas você pode chegar lá aos poucos.
Antes de iniciar sua tarefa, lista de exercícios ou leitura, programe o alarme para um tempo curto, digamos, 10 minutos. Ao fim desse intervalo, faça uma pausa de dois minutos. Repita até completar quatro ciclos e faça uma pausa maior. Vá aumentando o tempo de concentração aos poucos, de cinco em cinco minutos, até alcançar o período ideal para você.
Veja mais sobre a Técnica Pomodoro aqui.

Só mais cinco…

Não, não são aqueles “só mais cinco minutinhos” quando o despertador toca de manhã cedo. É uma técnica para resistir à vontade de largar tudo que bate diante de uma tarefa extensa ou aborrecida demais. É uma boa maneira de lidar com o desânimo que dá, por exemplo, quando aqueles 20 exercícios de Química parecem uma barreira intransponível, ou quando o livro não está nem na metade e você já pensa em desistir.
O objetivo aqui, em vez de largar tudo e sair correndo, é dizer a si mesmo que você vai fazer só mais cinco coisas antes de desistir. Podem ser mais cinco exercícios, cinco questões daquela prova do vestibular anterior, cinco páginas do texto, cinco parágrafos do livro obrigatório, ou mesmo cinco linhas! Quando acabar, do mesmo jeito que você aperta o botão do despertador pra dormir mais cinco minutinhos, fale pra si mesmo: “só mais cinco”. 
Ao quebrar a tarefa “de cinco em cinco”, você vai aguentá-la por mais tempo e, quem sabe, até cumprir o objetivo sem muito sofrimento. 

Meditação Instantânea

Às vezes, o que atrapalha é a ansiedade ("Tem muita matéria pra estudar, não vou dar conta!"), ou um problema qualquer que não tem nada a ver com o estudo. Nesses momentos, é importante deixar a mente livre de preocupações para que o tempo de estudo que você separou seja o mais produtivo possível.
Esta técnica de meditação pode ser aplicada em qualquer hora, em qualquer lugar. Vale para quando você precisa se concentrar nos estudos, mas também ajuda a baixar a ansiedade hora da prova.
O passo-a-passo é muito simples, está explicado num vídeo de mais ou menos cinco minutos e está em inglês, mas tem legendas em português. Clique aqui para ver o vídeo. 
Fonte: http://www.mundovestibular.com.br/articles/14759/1/Como-estudar-ensine-seu-cerebro-a-se-concentrar/Paacutegina1.html

Viciados em consumir


Capaz de gerar problemas financeiros e familiares, a compra compulsiva é um transtorno de difícil diagnóstico e requer a busca por tratamentos específicos. Pesquisa recente traz novos elementos na tentativa de contornar as dificuldades.
Por: Mariana Rocha

Viciados em consumir
Segundo pesquisadora, o comprador compulsivo pode ser caracterizado pela impulsividade e dificuldade de planejamento. (imagem: Colectivo Desazkundea/ Flickr – CC BY-NC-SA 2.0)
A compra compulsiva, também chamadaoniomania, é um distúrbio caracterizado pela aquisição exagerada – e desnecessária – de objetos, além da incapacidade de controlar os gastos. Apesar de ter sintomas característicos, a presença de sinais de depressão e ansiedade tende a dificultar o diagnóstico da doença, confundida frequentemente com o transtorno obsessivo compulsivo ou com o transtorno bipolar.
A presença de sinais de depressão e ansiedade tende a dificultar o diagnóstico da doença
Diante da dificuldade e da confusão frequente, a psicóloga Tatiana Filomensky decidiu, em sua pesquisa de mestrado, buscar aspectos específicos que ajudem a detectar o problema. Filomensky aplicou questionários de autopreenchimento a 80 pacientes do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, onde desenvolveu sua tese.
Todos os pacientes envolvidos na pesquisa já haviam sido diagnosticados com oniomania, transtorno obsessivo compulsivo ou transtorno afetivo bipolar. As perguntas dos questionários tentavam evidenciar quais eram os sinais específicos de cada distúrbio.
Com os dados coletados, a psicóloga conseguiu identificar algumas diferenças importantes entre as doenças. “Diferente do comprador compulsivo, o paciente com transtorno obsessivo compulsivo mostrou intensa preocupação com limpeza e possibilidade de contaminação, enquanto o paciente bipolar foi caracterizado pela variação de humor entre os estados eufórico e deprimido”, explica.
Filomensky explica que o comprador compulsivo pode ser caracterizado pela impulsividade e dificuldade de planejamento. Ela também detectou que o comprador compulsivo costuma gastar na tentativa de suprir carências emocionais. “O ato de comprar gera prazer e ameniza a sensação de tristeza do paciente, que não consegue controlar o impulso por gastar e acaba tendo problemas financeiros e familiares.”

Origem incerta

Não se sabe exatamente por que a oniomania surge, mas alguns estudos mostram que ela pode estar relacionada a mutações em um gene que codifica a MAO-A, proteína que controla a produção de serotonina. A doença também pode surgir após eventos traumáticos, como o abuso sexual ou por influência do consumismo que vem se difundindo cada vez mais na sociedade.
O comprador compulsivo se sente angustiado até poder comprar alguma coisa, como um dependente químico que anseia pela droga
Mesmo em quem não sofre do problema, o ato de comprar estimula a produção de substâncias que atuam no cérebro e geram prazer. A diferença entre quem tem uma queda por liquidações e quem é viciado em compras é que o comprador compulsivo se sente angustiado até poder comprar alguma coisa, como um dependente químico que anseia pela droga.
Quando não podem comprar, os oniomaníacos chegam a ter sintomas comuns aos de dependentes em abstinência de drogas, como tremores, suor em excesso e irritação. Em alguns casos, a busca pelo prazer é desastrosa: o paciente adquire dívidas e muitos passam horas comprando e perdem compromissos importantes no emprego, além de criar conflitos com os familiares que tentam impedi-los de comprar.
Por não haver um medicamento específico contra a doença, os psiquiatras costumam tratar os sintomas de depressão e ansiedade. No entanto, para a psicóloga, o melhor modo de administrar a doença é a partir de terapias que trabalhem os problemas característicos de cada paciente. “O tratamento psicológico é mais específico e usa a terapia individual ou em grupo para ajudar o paciente a se libertar do vício, reatar os laços com a família e se livrar das dívidas.”

Mariana Rocha

Ciência Hoje On-line

Física no cotidiano


Em sua coluna de abril, Adilson de Oliveira explica conceitos físicos por trás de fenômenos e objetos muito presentes na nossa vida e mostra como a ciência está inserida no nosso dia a dia.
Por: Adilson de Oliveira

Física no cotidiano
Praticamente todas as formas de energia usadas na nossa sociedade têm sua origem associada ao Sol, desde os alimentos que consumimos até os combustíveis que movem nossos veículos. (fotos: Sxc.hu e Wikimedia Commons)
O nascer do Sol é um dos mais belos espetáculos da natureza. Nas grandes cidades, infelizmente, ele passa despercebido, não somente devido à correria do dia a dia, mas também devido ao fato de que os altos prédios e a poluição acabam ocultando-o.
Quem sai cedo de casa eventualmente tem a chance de ver esse fenômeno. Talvez muitos de nós já tenhamos observado a rápida transição que ocorre no amanhecer. Parece que, em um instante, tudo está escuro e, minutos depois, o Sol domina o ambiente.
A grande influência do Sol sobre nós fez com que ele fosse considerado uma divindade em muitas culturas. A sua luz e o seu calor são essenciais para a manutenção da vida na Terra.
A luz e o calor do Sol são essenciais para a manutenção da vida na Terra
Praticamente todas as formas de energia usadas na nossa sociedade são oriundas do Sol. Por exemplo, a energia que extraímos dos alimentos foi quimicamente acumulada durante o processo de fotossíntese, por meio do qual as plantas usam a energia da luz solar para converter gás carbônico, água e minerais em compostos orgânicos e oxigênio gasoso.
Ao ingerir um alimento, nosso organismo quebra as ligações químicas dessas moléculas e obtém energia, que é armazenada em outras moléculas, como a adenosina trifosfato (ATP).
Quando nos dirigimos para o trabalho, seja por meio de automóveis, ônibus ou metrô, também utilizamos, de certa forma, a energia do Sol. Os biocombustíveis, gerados principalmente a partir da cana–de-açúcar (caso do etanol) e de óleos vegetais (caso do biodiesel), são exemplos disso.
Na produção de combustíveis fósseis, derivados do petróleo, também ocorre uma transformação da energia solar. Admite-se que a origem do petróleo esteja relacionada à decomposição dos seres que formam o plâncton e de outras matérias orgânicas – restos de vegetais, algas e animais marinhos –, em um processo que demora centenas de milhões de anos. Quando queimamos esses combustíveis, liberamos a energia química que foi acumulada na matéria orgânica durante esse tempo.
A energia hidrelétrica, que representa grande parte da matriz energética do Brasil, também depende da energia solar. No momento em que a água desce pela represa da usina hidrelétrica, fazendo com que as turbinas girem e produzam eletricidade, há o processo de transformação da energia de movimento (energia cinética) da água em energia elétrica. Para que a represa continue a ter água, é necessário que haja chuvas e estas só acontecem por causa da evaporação da água provocada pelo Sol.
Portanto, uma manhã ensolarada não é apenas prenúncio de um dia bonito. Ela deve servir também para nos lembrar da importância do Sol em nossas vidas.

O dia começa

Durante o dia, em nossos empregos ou em nossas casas, realizamos diversas atividades que dependem de certos dispositivos ou fenômenos e normalmente não temos noção de como eles funcionam ou ocorrem. Utilizamos, por exemplo, a radiação eletromagnética para controlar à distância televisores, aparelhos de DVD, videocassetes, videogames, computadores etc.
Geralmente esses equipamentos utilizam controles remotos que emitem radiação na faixa do infravermelho, com comprimento de onda entre 1 milímetro e 1 micrômetro (milionésima parte do metro). Esses comprimentos de onda são invisíveis aos nossos olhos, pois são muito longos (enxergamos comprimentos de onda entre 630 e 390 nanômetros).
Controle remoto
Os controles remotos usam radiação infravermelha para enviar os comandos aos aparelhos controlados por eles. (foto: Subhadip Mukherjee/ Sxc.hu)
Ao acionarmos os botões do controle remoto, ele emite pulsos longos e curtos que representam um código binário, que é convertido pelo aparelho receptor. Cada botão do controle remoto corresponde a determinado código, representado por frequências específicas que são enviadas para o equipamento controlado. Ao receber esses sinais, o aparelho os decodifica e realiza as operações solicitadas (trocar de canal, aumentar/diminuir o volume etc.).
Em nossas casas, também são comuns os fornos que utilizam radiações na faixa das micro-ondas (com comprimentos de onda entre 1 metro e 1 milímetro). Os fornos de micro-ondas comerciais operam com radiação de comprimento de onda de aproximadamente 12,2 cm.
Nesses aparelhos, o cozimento dos alimentos ocorre pela absorção da energia das micro-ondas pelo corpo. Como as micro-ondas são uma radiação eletromagnética, elas fazem com que as moléculas que apresentam dipolo elétrico (sistema com duas cargas elétricas opostas – positiva e negativa – e de mesmo valor), como as de água, oscilem e, como consequência, dissipem a energia absorvida.
Os aparelhos celulares, tão comuns atualmente, também operam na faixa das micro-ondas, mas com potência muito menor, da ordem de 3 watts. Nos fornos de micro-ondas, a potência é de aproximadamente 1.100 watts.
Processos descritos pela chamada física quântica ocorrem no interior de computadores,smartphones etablets
Já os computadores, smartphones e tabletsutilizam processadores que chegam a conter mais de um trilhão de componentes. Esses componentes são responsáveis pelo processamento das informações e conseguem transformar as centenas degigabytes que estão armazenadas nos discos rígidos em imagens, sons, cálculos, textosetc.
Processos descritos pela chamada física quântica (que estuda os sistemas em escala atômica) ocorrem no interior desses dispositivos e os levam a executar operações lógicas que resultam em todas as maravilhas que os computadores realizam (saiba mais na coluna ‘Pequenos habitantes de um mundo próximo’).

A noite chega

Quando o dia termina, começam a surgir alguns pontos brilhantes no céu, que, em uma noite sem luar, longe das luzes da cidade, podem ser vistos aos milhares. Esses pontos, as estrelas, sempre nos maravilharam. Embora essa visão de céu noturno seja rara nos dias de hoje, ela é, sem dúvida, tão bela quanto o amanhecer.
Se olharmos com cuidado, perceberemos que as estrelas têm diversos tamanhos e cores e que estão dispostas de maneira a formar certos padrões, nos quais visualizamos algumas figuras. Chamamos esses agrupamentos de estrelas de constelações. Em certas regiões do céu, é possível perceber aglomerados com muitas estrelas e nuvens opacas (nebulosas). É o caso da constelação de Órion, uma das mais visíveis no céu, principalmente entre o início de dezembro e o final de maio ou começo de junho.
Constelação de Órion
A constelação de Órion é uma das mais visíveis no céu, especialmente entre o início de dezembro e o final de maio ou começo de junho. (foto: Nasa)
As estrelas podem ter diâmetros que variam de centenas de milhares de quilômetros (nosso Sol, por exemplo, tem 1,4 milhão de quilômetros) até mais de um bilhão de quilômetros, como é o caso de Betelgeuse, a estrela vermelha da constelação de Órion. Elas são formadas principalmente por hidrogênio e hélio em altíssimas temperaturas.
A quantidade de massa e a temperatura da estrela determinam seu tamanho e sua cor. E quanto maior a massa da estrela, mais quente ela tende a ser. A temperatura na superfície de estrelas com massa igual à do Sol é da ordem de 6.000 ºC, mas, em seu interior, esse valor atinge dezenas de milhões de graus Celsius.
Diante dos tamanhos desses distantes sóis, cuja luz viaja milhares de anos até chegar aos nossos olhos, nos lembramos do quanto somos pequenos comparados à imensidão do cosmos.
Mas nos congestionamentos de trânsito e nas filas de supermercados e bancos, pouco tempo nos sobra para refletirmos sobre esse complexo mundo que está a nossa volta. Precisamos incorporar um pouco mais a ciência ao nosso cotidiano, afinal, ela pode ser tão bela e fascinante quanto todos os fenômenos que explica.

Adilson de Oliveira
Departamento de Física
Universidade Federal de São Carlos

Doenças desconhecidas que a comida dos brancos provocou



No primeiro levantamento da saúde indígena não foi registrada a ocorrência de doenças cardiovasculares e menos de 5% dos examinados tinham pressão arterial elevada. Mas essa situação mudou
por Roberto Baruzzi

© rsfatt/Shutterstock
O Parque Indígena do Xingu, inicialmente Parque Nacional do Xingu, resultou de um amplo movimento que teve a participação dos irmãos Villas Bôas, além de personagens como Darcy Ribeiro, Noel Nutels e Heloísa Torres, diretora do Museu Nacional, entre outros defensores dos direitos dos povos indígenas. O Parque cobria uma área de  aproximadamente 26.300 km2, estendendo-se por 300 km da região dos formadores do rio Xingu, ao sul, e ao longo de sua calha até a cachoeira de Von Martius, ao norte, nos  limites do Mato Grosso e Pará. Era habitado por 14 povos indígenas dos troncos ou famílias de línguas aruaque, caribe, jê e tupi, incluindo os trumai, de língua isolada.

Em seus primórdios a história do Parque se reporta ao início do ano de 1946, quando a  expedição Roncador-Xingu, no contexto do movimento de Marcha para o Oeste do  governo federal, atingiu o rio Kuluene, um dos formadores do Xingu, após atravessar o território xavante, guerreiros temidos e avessos a qualquer contato com outros povos. Presentes na expedição, os irmãos Villas Bôas: Orlando, Cláudio e Leonardo tiveram seus primeiros contatos com os kalapalo e kuicuro, no Juluene. Nos meses seguintes o relacionamento se estendeu aos demais povos dos formadores do rio Xingu ou Alto Xingu. Em 1953, o processo de contato se estendeu até os metuktire, ou kayapó, na área norte do Parque, próxima da cachoeira de Von Martius.

Na época, teve início um movimento em defesa desses povos, ameaçados pela venda das terras que ocupavam desde tempos imemoráveis, o que levou à criação do Parque. Entre as atribuições definidas no decreto de sua fundação, estava: “Garantir aos povos indígenas a assistência médica, social e educacional, indispensável para assegurar sua soberania, com a preservação de seus atributos culturais”.

Nesse contexto se inseria a seguinte declaração dos Villas Bôas, de anos anteriores, baseada em sua convivência com povos indígenas: “É neste setor da saúde que a ajuda do civilizado pode ser de transcendente importância. Diante dos acessos violentos de malária, de gripe e de pneumonia os pajés são impotentes. Se for dada a esses índios uma assistência conveniente, não temos dúvidas de que em poucos lustros teremos  novamente o Alto Xingu como hábitat dos mais fortes e expressivos indígenas do Brasil”.

Em 1965, a convite de Orlando Villas Bôas, diretor do Parque, uma equipe médica da Escola Paulista de Medicina (EPM), hoje ligada à Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), foi avaliar as condições de saúde de sua população. Da avaliação resultou um acordo pelo qual a EPM se comprometia a enviar equipes médicas periódicas e, em situações epidêmicas, iniciar um plano de vacinação e abrir o Hospital São Paulo como unidade de retaguarda para seus habitantes. Essa foi a solução viável, dado o isolamento geográfico na época, e que se tornou possível com o apoio da Força Aérea Brasileira (FAB) no transporte das equipes médicas e remoção de pacientes. Os grupos  voluntários, eram formadas por médicos, enfermeiras e dentistas, contando sempre com a presença de alunos. Os estudantes têm assegurado, por mais de quatro décadas, a continuidade do Programa de Saúde ou Projeto Xingu, como é conhecido. Muitos deles voltaram a participar de outras equipes, mesmo depois de formados, alguns como membros do corpo dirigente do Projeto.

A política de saúde da EPM, no Parque, foi assim expressa por mim, em 1966, na condição de coordenador: “O desafio não é simplesmente implantar no Parque um modelo de assistência à saúde calcado na medicina ocidental, com mera transferência de tecnologia e locação de recursos. O real desafio é trazer benefícios à saúde do índio sem causar danos irreversíveis à sua cultura, sem destruir suas crenças e sua medicina tradicional. A busca de resultados imediatistas poderia significar um dano para essa população no decorrer do tempo, dentro do conceito de saúde definido pela OMS como um estado de completo bem-estar físico, social e mental”.

A introdução de uma ficha médica no trabalho de campo, desde os primórdios do Projeto Xingu, permitia que cada um dos membros de uma aldeia fosse chamado nominalmente para ser examinado e tratado entre os que apresentavam alguma queixa. Eram aplicadas as vacinas previamente determinadas e feito o registro das  intercorrências clínicas, gestações, nascimentos e óbitos. Na sequência, a equipe de saúde ia de casa em casa da aldeia para atender aqueles que, por condições de saúde ou por outros motivos, não haviam comparecido aos exames. Uma foto atualizada  periodicamente, somada a outros dados da ficha médica, facilitava a identificação individual, a salvo de mudanças no nome (prática comum) e de diferenças na sua transcrição gráfica. As fichas médicas têm possibilitado a realização de numerosos estudos nas áreas das ciências humanas e da saúde.

Desde o início estabeleceu-se um clima de mútuo respeito e colaboração entre médicos e pajés. Com o transcorrer do programa de saúde foi dada maior atenção à formação de agentes de saúde e auxiliares de enfermagem indígenas, indicados por suas  comunidades. Em 2001, o primeiro grupo de formados recebeu seus certificados em cerimônia realizada na Escola Paulista de Medicina. Atualmente, cerca de 40 formados integram o quadro de saúde no PIX, remunerados pelo Sistema Único de Saúde (SUS). A presença de agentes de saúde facilita a participação das aldeias na discussão dos problemas de saúde, pelos traços culturais comuns e uso da língua nativa.

De 1966 a 1971, foi realizado o levantamento das condições de saúde nas aldeias, com o uso das fichas médicas. Não foi observada a ocorrência de doenças cardiovasculares, e menos de 5% dos examinados apresentavam níveis de pressão arterial elevados, pouco acima dos valores considerados normais, sem que houvesse aumento com o decorrer da idade, como ocorre em populações não indígenas. Os níveis séricos do colesterol e dos triglicérides eram normais e dentro dos resultados considerados desejáveis.

No quadro nosológico havia maior prevalência de doenças infecto parasitárias em relação às doenças não transmissíveis. Era intensa a transmissão de malária, a principal causa de morte em todos os grupos etários a partir dos primeiros anos de vida. Em cerca de um terço da população examinada, o baço era palpável abaixo da cicatriz umbilical em decorrência de frequentes e repetidos ataques da malária. A mortalidade infantil era elevada.

Num retrospecto, pode-se afirmar que o Projeto Xingu, ao longo dos anos, contribuiu para a melhoria das condições de saúde dos povos do Parque. A população, que, em 1966, era de 1.135 pessoas, passou para 5.630, em 2009. No atendimento de casos de  maior gravidade e mesmo de outras áreas indígenas, tem sido de grande importância o Ambulatório do Índio do Hospital São Paulo da Sociedade Paulista para o Desenvolvimento da Medicina (SPDM).

A malária deixou de ser importante causa de morte, presente apenas em raros surtos epidêmicos, em áreas limitadas, e rapidamente debelados com a identificação do plasmódio transmissor e a adoção de pronto tratamento. No que se refere à tuberculose, doença que requer constante controle, houve gradativa redução no número de casos diagnosticados que passou de 7 casos, em 2004, para apenas 1, em 2010.

Neste momento o Parque é uma ilha verde cercada por áreas desmatadas para abertura de fazendas, e cidades surgiram em seu entorno, estradas penetram em seu território. A poluição das nascentes dos formadores do Xingu, situadas fora da reserva, tem comprometido a pesca, com prejuízo para a alimentação dos povos xinguanos. A introdução de novos alimentos tem provocado mudanças no padrão alimentar tradicional, com excesso de sal e açúcar e de alimentos ricos em carboidratos como arroz e macarrão. Houve, paralelamente, redução da atividade física pela introdução de novas tecnologias.

Em decorrência dessas mudanças, houve a introdução gradativa das chamadas doençasdo Mundo Ocidental ou “doenças do branco”: enfermidades cardiovasculares, hipertensão arterial e obesidade, com especial atenção para o surgimentodos primeiros casos de diabetes, doença que tem sido diagnosticada em número considerável entre os xavante. Há dúvidas sobre eventual maior suscetibilidade do índio ao diabetes, cabendo  lembrar que os pima, no Arizona, nos Estados Unidos, há vários anos, foram apontados como portadores da maior prevalência de casos de diabetes em grupos humanos.

No decorrer do tempo novos desafios apareceram na área da saúde das diferentes etnias. Esses desafios também estão presentes no Parque Indígena do Xingu, e no que se refere às “doenças do branco”, ao lado do diagnóstico e tratamento precoces, assume maior importância esclarecer a população quanto aos riscos decorrentes de mudanças em seu padrão de vida e quanto às medidas preventivas que podem ser introduzidas no âmbito familiar.

Para se obter alguns resultados nesta área é necessário contar com a orientação do pessoal da saúde em campanhas de esclarecimento, com o apoio das lideranças indígenas e plena participação dos agentes indígenas de saúde.

Roberto Baruzzi médico da antiga Escola Paulista de Medicina, atual Universidade Federal de São Paulo, foi um dos pioneiros na assistência médica às populações indígenas do Xingu.
Fonte:
http://www2.uol.com.br/sciam/artigos/doencas_desconhecidas_que_a_comida_dos_brancos_provocou.html 

domingo, 1 de abril de 2012

Dois em um?


Após usar um medicamento contra diabetes para tratar camundongos com sintomas do mal de Alzheimer, pesquisadores descobrem mecanismos compartilhados pelas duas doenças e abrem portas para novas terapias.
Por: Mariana Rocha

Dois em um?
Neurônios de camundongos com sintomas de Alzheimer respondem a tratamento prescrito a diabéticos. Apesar disso, ainda é preciso mais pesquisas para entender sua ação em humanos que sofrem da doença degenerativa. (imagem: Theresa Bomfim)
Aprovado em 2006 no Brasil, a exenatida é um medicamento capaz de controlar os níveis de glicose no sangue. Sua eficácia em pacientes com diabetes tipo 2 é inegável, mas pesquisadores da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) mostram que o remédio pode ir além. Ao tratar camundongos que exibem sintomas do mal de Alzheimer, os cientistas observaram melhora significativa na formação de memória dos animais.
O trabalho foi publicado no periódico The Journal of Clinical Investigation e se baseia em estudos anteriores que mostram a grande incidência de Alzheimer em pacientes com diabetes e a resistência à insulina em cérebros de quem desenvolve a primeira. Partindo de evidências da ligação entre as duas doenças e esse hormônio, os pesquisadores buscam entender melhor os mecanismos que compartilham.
No recente estudo, trataram camundongos transgênicos com sintomas de Alzheimer com o medicamento de diabetes tipo 2, capaz de provocar uma ação parecida com a da insulina por meio de mecanismos alternativos. Em seguida, submeteram os animais a testes de memória, observando neles uma maior capacidade de aprender e memorizar caminhos em um labirinto em comparação com camundongos não tratados com exenatida.
Os pesquisadores também identificaram melhoras nas vias de sinalização de insulina no cérebro dos animais que receberam o remédio, o que reforça evidências de uma possível relação do hormônio com a perda de memória no Alzheimer. Segundo Theresa Bomfim, aluna de doutorado da UFRJ que participou do estudo, outras pesquisas mostram que, quando um animal é gerado sem a capacidade de ativar as vias da insulina, o aprendizado se torna muito mais difícil.
Esquema explicativo do estudo.
Esquema explicativo do estudo. Clique na imagem para ver os detalhes.

Ligações perigosas

Já se sabe, há décadas, que o diabetes é causado pela deficiência de insulina, responsável por controlar a entrada de glicose na célula para geração de energia. Mas, somente em 2009, a insulina foi descrita como um elemento importante no aparecimento do mal de Alzheimer, não coincidentemente por Fernanda De Felice, bióloga da UFRJ que coordena o atual estudo.
Segundo a pesquisadora, a atividade desse hormônio é diferente em neurônios de pacientes com a doença. “As proteínas onde a insulina se liga para permitir que a célula faça a captação de açúcar para gerar energia são colocadas dentro do neurônio na doença de Alzheimer, impedindo a ação da insulina.”
A resistência à insulina se dá pela presença de grupos de pequenas proteínas chamados oligômeros. Quando eles se ligam ao neurônio, além de impedir a ação do hormônio, os oligômeros também destroem as sinapses nervosas, impedindo a formação de memória.
Os resultados do estudo abrem portas para um novo tratamento, mas ainda é preciso mais pesquisas para entender sua ação em pacientes com Alzheimer. Apesar de ter sido aprovado para diabéticos, o uso da exenatida deve ser avaliado em pessoas com resistência à insulina apenas no neurônio, evitando efeitos colaterais do excesso de atividade desse hormônio em células como as do músculo ou do fígado.

Desafios à vista

A próxima etapa do estudo requer ensaios clínicos, mas os pesquisadores contam que o Brasil não possui estrutura para esse tipo de experimento. Além disso, a falta de exames precisos para o diagnóstico do mal de Alzheimer complica a execução dos testes. 
Ferreira: “Sem o diagnóstico, como saber se estamos tratando uma pessoa com Alzheimer ou apenas com lapsos de memória?”
“A doença só é confirmada após a morte, quando é possível ver no cérebro as lesões causadas por ela”, esclarece o químico da UFRJ Sérgio Ferreira, coautor da pesquisa. “Sem o diagnóstico, como saber se estamos tratando uma pessoa com Alzheimer ou apenas com lapsos de memória?”
Outra dificuldade em adotar a exenatida como tratamento para o Alzheimer é o preço.  O medicamento pode custar até R$ 500.
Diante dos empecilhos que ainda precisarão ser superados, De Felice alerta para formas de prevenir a doença. “Em animais, é possível ver que a atividade física ajuda na melhora das funções de aprendizagem e memória, além de prevenir outros efeitos maléficos do diabetes como problemas cardíacos e de visão.”

Mariana Rocha

Ciência Hoje On-line